segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Incêndio do Museu Nacional


Acompanho desde os primeiros minutos o incêndio que destruiu o prédio principal do Museu Nacional e tenho ouvido um monte de asneiras proferidas por oportunistas e focas mal informados.



Não sou nem quero ser dono da verdade, só vou falar do que vive neste palácio durante alguns anos.



Como a maioria dos que eventualmente acessam o meu blog sabem sou formado em Ciências Biológicas desde o final da década de 70 e na época fui estagiário da então FEEMA - Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente no DEVET - Departamento de controle de vetores no setor de mamíferos sob orientação de grandes profissionais do qual destaco o nome do Dr. João Moojen que com certeza representa todos os demais da instituição.



Como uma das minhas atividades estava a de frequentar a sessão de mastozoologia do MN, onde aprimorava os meus conhecimentos em taxidermia (empalhamento) de exemplares coletados na natureza e lá depositados para que servissem de parâmetros para os estudos das populações desses animais.



Primeiramente sobre o descaso da manutenção do MN (Museu Nacional) desde 1977, que frequento com olhos profissionais e acadêmico, constato o total despreparo daquele prédio para a função que desempenhava.  Tratava-se de um palácio onde os pisos, tetos, portas e janelas eram de madeira e dessa forma sujeito a todo tipo de incêndio.  Agravando a situação, era a existência de inúmeras divisórias de madeira que delimitavam departamentos e laboratórios.  O material armazenado nas áreas do meu conhecimento eram formadas por milhares de peles secas, crânios secos e recipientes contendo exemplares conservados em álcool ou formal, todas as situações extremamente inflamáveis.



Podemos acrescentar todo o material necessário para o desempenho dessas atividades tais como as galões de álcool, fardos de tecido e algodão, e muito... muito papel e madeira.



Não podemos esquecer das inúmeras bibliotecas especializadas de trabalho, distribuídas por todo o prédio e centenas de metros de fios elétricos que formavam gambiarras para dar um mínimo de condições de trabalho na situação precária existente.



Então não se pode simplificar a questão:



Primeiro o problema se arrasta há dezenas de anos, dos quais pelo menos quarenta eu presenciei.



Não seria uma simples brigada de incêndio que teria qualquer êxito contra um foco em quaisquer das áreas do MN;



Não foi, com certeza, a eventual falta de pressão nos dois hidrantes existentes ao redor do museu que evitariam a tragédia que se abateu sobre aquela Instituição;  



Aqui vai um detalhe o uso de água sobre a coleção existente destruiria grande parte se não a totalidade do material;



Não se pode crucificar o corpo de bombeiros por sua ação ou falta dela naquela situação;



Será que podemos culpar as administrações da UFRJ pelo ocorrido? Será que toda a verba destinada a aquela Universidade seria suficiente para prevenir o ocorrido?  Com certeza não!



Algumas poucas Instituições do mundo possuem parte das condições que pudessem evitar a tragédia.



Agora vamos incluir todo o tipo de burocracia que impedem a atualização à título de tombamento histórico.  Juntamos todo tipo de dificuldade na obtenção, liberação e utilização das verbas que poderiam ser aplicadas.



Seria necessário a construção de "containers" que isolassem as diversas áreas do museu, contando com portas estanques que impedissem a propagação do incêndio, no lugar de sistemas convencionais de sprinters de água que destruiriam grande parte das coleções pelas suas características. O que melhor a ser usado são os sprinters de CO2 ( gás carbônico ) associados a sensores de calor.



Sobre o que foi perdido é inestimável, 90% de todo conhecimento foi perdido não só do passado, mas principalmente do futuro que não tem em que basear as pesquisas, perderam-se os parâmetros.



Agora, só uma avaliação e uma ação contundente, sem preconceitos para evitar outras tragédias pois nessa nada pode-se fazer.




... Essa não é uma tragédia pontual do Museu Nacional... Essa é a tragédia nossa, do povo brasileiro, da falta de educação, da falta de cultura, da falta de política pública com Ps maiúsculo... Culpa da nossa covardia, da nossa leniência da nossa complacência.



Gilberto R. Azevedo 
03 de setembro de 2018

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